terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Planejando o parto!

Por mais que falemos sobre a
 importância do planejamento para um
 parto respeitoso, essa porta só abre
por dentro!
Tenho percebido na minha vivência como doula e eterna aprendiz que quando aquela portinha que só abre por dentro de repente se escancara para a importância do empoderamento feminino para um parto respeitoso, a gestante e sua família se descobrem em um emaranhado de informações e a demanda por tomada de decisões se torna urgente, o que pode assustar um pouco. 

Não vou mentir, é muita informação que cai no colo de uma hora para outra: que diabos é clampeamento tardio do cordão? Por que não pode tracionar a placenta? E parir de cócoras é melhor para o bebê por que?

Muitas dessas dúvidas surgem porque há aproximadamente três gerações o parto foi roubado do cenário domiciliar para os muros fechados dos hospitais e da protocolar prática médica. Antes, as crianças e os homens vivenciavam e participavam do trabalho de parto das mulheres da família. Hoje, em alguns hospitais nega-se até mesmo o direito legal de a mulher ter um acompanhante ao seu lado nesse momento tão importante.

Nós não temos mais familiaridade com o partejar. No máximo, ouvimos as histórias mais cabeludas a respeito de bebês nascendo depois da hora, de mães levando "pontinhos" ou de cesáreas agendadas às 38 semanas de gestação porque "o bebê já está pronto mesmo para vir ao mundo".

Não admira que ao adentrar nesse mundo da humanização** bata um desespero de que não vai dar tempo de saber tudo o que é preciso até o momento de dar à luz o bebê. 

Por isso o plano de parto é tão importante! Ele serve como um guia de estudo e empoderamento. Pois é, pode-se comparar o planejamento do parto a um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). É preciso organização, disciplina e perseverança para encerrar o ciclo da gestação com um nascimento saudável e amoroso.

Aos poucos, conhecendo um termo de cada vez, conscientizando-se a respeito do que é imprescindível para a boa saúde física, psicológica e emocional do bebê e da parturiente, o plano de parto vai se tornando algo palpável e natural para a família.

Modelos existem aos montes por aí. É só dar uma busca no Google que você vai encontrar exemplos mil. O que importa mesmo é o conteúdo, que vai ser particular para cada trinômio mãe-bebê-família.

Quer desobediência maior do que se
recusar a deitar ao dar à luz?
E o conteúdo não é necessariamente a negação do protocolo hospitalar, embora seja a toada dos planos de parto... Afinal haja intervenção desncessária! Só com muita desobediência civil para passar por tudo isso ilesa!

Não é também uma forma de engessar a prática médica. Ao tirar-se o véu de conceitos pré estabelecidos, é possível perceber a maior flexibilidade dos procedimentos que podem ser realizados para o bom andamento do parto: em vez de contar somente com a ocitocina sintética para "acelerar" as contrações e o parto, por que não sugerir uma nova posição ao parir, por exemplo?

O plano de parto é, principalmente, uma declaração de que a gestante e seu acompanhante têm ciência dos procedimentos e protocolos hospitalares e, acima de tudo, sabem que é um direito negar ou aceitar a realização de tais procedimentos e protocolos após serem informados de maneira compreensível, objetiva e educada (o educada é por minha conta) quais as necessidades de tais procedimentos e quais as consequências ao submeter-se ou não a eles. 

Enfim, o plano de parto é um instrumento que auxilia no retorno do parto e do nascimento ao lugar de onde eles nunca deveriam ter saído: aquele em que bebê, mulher e família sejam tratados e respeitados como seres humanos vivenciando um processo fisiológico natural, seja em um hospital, em uma casa de parto ou em casa.


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(* Tenho cá minhas dúvidas a respeito do termo humanização, afinal, tem algo mais humano do que ocitocina sintética ou parir deitada para o médico ter uma visão melhor do canal de parto? Sobre "desumanização" ou mamiferização do parto, leia Michel Odent)

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Eu "rebozo", tu relaxas, os bebês nascem!

"Salagadula mexegabula bibidi-bobidi-bu!!"
As fadoulas entenderão! :P
Em um dos meus posts (Super Doula em Ação!) falei sobre a malinha da doula, que carrega algumas “ferramentas” (ou seriam varinhas mágicas?) que nos ajudam a proporcionar à gestante mais conforto, alívio da dor e transformar o momento único do parto e do nascimento do bebê em pura magia!

Estou encantada por todas essas ferramentas e a cada conversa com alguma colega de profissão descubro um ou outro truquezinho que é bom ter na manga (e na mala) para situações inusitadas, como seringas para ajudar na sucção da mangueira que vai esvaziar a banheira portátil (dica da Pâmella Souza) ou etiquetar minuciosa e carinhosamente as tampinhas dos óleos e essências para não se confundir caso esteja todo aquele clima escurinho no quarto (dica da Maressa Silva)!

Nas últimas semanas, porém, o rebozo para mim é a bola da vez. Acabei de fazer um workshop com a Pâmella (para conhecer melhor o trabalho dela acesse: Dança do Ventre Materno), com diversas técnicas e dicas de como usar esse tecido encantado. Sim, é preciso técnica e não apenas sair "rebozando" quadril por aí. Cada movimento tem uma finalidade e algum possível erro pode atrapalhar o andamento natural do parto no lugar de auxiliar.... muito cuidado!


Imagem do blog Bibliografia de uma Doula

O rebozo é uma espécie de xale, originalmente mexicano, popularizado entre as doulas e parteiras brasileiras, pela encantadora parteira Naoli Vinaver. Feito manualmente em tear, com algodão, é usado pelas mexicanas para cobrir-se e para carregar bebês (como um sling) ou mercadorias. E pode fazer milagre em um parto estagnado pelo medo, pela dor, por bebês que ainda estão “altos” ou quando ainda está tudo meio morno para frio, sabe? Uma "rebozada" no quadril promete esquentar tudo, o bebê desce, o quadril abre, o parto engrena… e tudo flui!

Em auto-retratos, Frida Khalo
costumava ilustrar seus rebozos

Dá só uma olhada nesse artigo sobre o rebozo na página Mães da Pátria, que resgata o trabalho de parteiras tradicionais Brasil a dentro! Foi aqui que eu descobri que o verbo rebozar, em espanhol, significa cobrir.

Bom… eu tô apaixonada e não vejo a hora de sair por aí rebozando minhas doulindas, praticando algumas “naolices”, como diz a Pâmella!


E você, colega doula, que varinhas mágicas você costuma usar nos partos que acompanha? Compartilha aí! ;D 

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Bora formar a roda para papear?!



"Se você quiser saber aonde eu vou, aonde tenha uma roda de conversa de mulheres, é para lá que eu vou"

Ok, ok... a paródia ficou fraquinha mas é verdade, gente! Se quiser me encontrar é só procurar nas rodas de conversa sobre parto e maternagem que vêm acontecendo em diversos espaços do ABC, Região Metropolitana de São Paulo.

Quer imagem mais linda: barrigudas, mães e suas crias participando de audiências
 públicas, reuniões de conselhos de saúde e de hospitais públicos?
(Fotos: Sarah Bryce)

Em Santo André, o Espaço ComVida está em período de férias, mas logo logo volta à ativa, com a querida Bruna Cortes, Doula e emprededora no "Papa ou Papinha?", no comando de diversas atividades, inclusive para as pequenas e pequenos. 


As reuniões do Maternamente, movimento criado por Deborah Delage e Denise Niy, acontecem sempre no último sábado do mês e incentivam o empoderamento feminino através da participação social ativa, inclusive alcançando diversos avanços em políticas públicas por meio do diálogo com o poder público. 


Em São Bernardo do Campo, a Rede de Empoderamento Materno (REM), idealizada pela xará Raquel Carvalho, também doula e estudante de obstetrícia, está bombando com rodas de conversa, encontros de puérperas e workshops para profissionais.


Mamastê!
(Foto: Evelyn Angel Fotografia)
A Larissa, querida colega-amiga de turma no curso de doulas, preserva o Espaço Santosha e com a ajuda da terapeuta Nanda Aranda promove o Mamastê, recebendo, quinzenalmente (às segundas-feiras), mamães, gestantes, doulas para trocar experiências sobre amamentação, terapias alternativas para a gestação e o parto, além de oferecer aulas de yoga voltadas para a preparação do corpo e a mente para o trabalho de parto.

Todas as rodas de conversas abrigadas por esses espaços são gratuitas (outras atividades têm custos "humanizados"): é só se "aprochegar", sentar e curtir um bom papo e aproveitar a troca de experiências e vivências.

Para mim, tem sido incrível poder compartilhar e aprender com tantas mães, gestantes, doulas, terapeutas, obstetrizes... Só estando presente para sentir esse poder feminino que emana do encontro entre mulheres! Me identifico com cada história, empatizo com o sofrimento, sofro junto, dou risada junto, me sinto mais uma da espécie e mesmo com rostos diferentes em cada roda, me sinto em casa, simplesmente contemplo que encontrei "minha turma"!

Recomendo fortemente a participação em rodas como essas, durante a

Roda de gestantes na REM. Papais também são benvindos!

gestação, no puerpério e mesmo para quem não é mãe. Até e, inclusive, para pais, avós e outros familiares e amigos! 


Na retomada da conversa olho no olho, no aprendizado por meio da oralidade, (prática tão tradicional e tão abandonada nessa era de conectividade virtual) no abraço e na troca respeitosa, admirando e apoiando as mulheres e suas famílias que escolhem gestar, parir e educar os filhotes de nossa espécie, vamos nos reencontrando com o que nos faz humanos: o convívio pacífico em sociedade, o aprender juntos e ativamente, o empoderamento para a tomada de decisões, o identificar no outro a diferença que nos faz iguais!


Bora papear em roda?

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Super Doula em Ação! (tã dã)

Venho pesquisando bastante nas últimas semanas que objetos posso levar na minha mala de doula que me auxiliem no momento em que alguma gestante entrar em trabalho de parto.

Uma doula pode ter vários segredinhos para o momento em que as contrações ficarem mais doloridas e intensas, para o momento que a mulher se sentir mais vulnerável. Desde paninhos para secar o suor da testa ou fazer compressas quentes, óleos ou cremes para massagear a lombar, as costas, as pernas, até florais e óleos essências para lidar com a dor emocional, com o medo e a ansiedade.

Por estar nesse mundo da doulagem há pouco tempo, estava (e ainda estou) me deixando levar pela sensação de que eu preciso ter muitos desses objetos comigo para exercer com excelência meu trabalho. Confesso que não vejo a hora de ter a minha malinha completa e sair por aí orgulhosa assim que uma gestante avisar que precisa de mim (só vai faltar a roupa de heroína e uma musiquinha com o slogan no final: “Super Doula em ação!” – tã dã).
Mas recentemente passei por uma situação que mostrou o que é realmente necessário para acompanhar uma gestante em trabalho de parto: confiança em si e no processo.

Fui chamada, às pressas, para substituir uma doula em um parto hospitalar. Já tinha separado alguns objetos “improvisados” para esse momento: uma canga de praia no lugar do rebozo, um vidrinho de óleo de semente de uva e um leque. Na hora, senti medo…  “e se eu precisar de mais coisas?", pensei. Não tinha mais nada… e eu prometi chegar em uma hora no hospital, indo de transporte público. Troquei de roupa rapidamente, coloquei minhas singelas ferramentas de trabalho na bolsa (que ficou tão murchinha, coitada) e saí.

No caminho, um clarão: “bem, se a doula que conseguiu atender ao chamado da colega fui eu, uma razão deve ter. Vou fazer o melhor que puder!”. Poucas vezes na vida me coloquei em uma situação parecida: em qualquer prova que fosse fazer, estudava e estudava muito; em apresentações de trabalhos, lia e relia os textos preparados mil vez em frente ao espelho, ensaiando. Dessa vez, eu não havia me preparado previamente, mesmo assim, me senti confiante.

O bebê nasceu bem. Infelizmente, a mãe sofreu violência no parto. Definitivamente, um hospital não é o melhor lugar para um bebê vir ao mundo, muito menos com uma equipe que não está por dentro das evidências científicas e da boa e velha empatia.

A doulagem transcorreu bem, apesar de nos conhecermos somente naquele instante, apesar de a doulanda chamar pela doula titular nos momentos mais dolorosos em que queria “negociar” a anestesia… de alguma forma a conexão se estabeleceu. E ao depositar confiança em mim, essa gestante me mostrou que eu poderia confiar em mim mesma. No fim, acabei não usando o “rebozo” e nem o óleo, só o leque para aplacar um pouquinho o calor (o da parturiente e o meu, diga-se de passagem).

As gestantes que me escolheram para lhes acompanhar em sua jornada, mesmo eu sendo uma “novata” na área, cada vez que me chamam no whatsapp para sanar alguma dúvida… elas podem não fazer a menor ideia, mas estão me ajudando a fortalecer essa confiança em mim mesma e no processo natural da gestação e do parto.

Minha malinha ainda pode estar murchinha, mas minhas mãos e braços estão prontos para fazer massagens, dar abraços e carinho. Meu coração está pronto para receber com empatia as dores e os medos, os prazeres e alegrias da gestação e do parto das minhas queridas doulandas de agora e das que estão por vir!